Quanto custa o amor?

Este blog nunca esteve tão abandonado. Consequência da inspiração, que me abandonou sem informar o seu destino. Na verdade acho que ela ocupa em mim o mesmo lugar da preocupação e da frustração. Por conseguinte, não consegui comportar as três ao mesmo tempo nesse começo do ano. As preocupações com o futuro, as frustrações pessoais e externas que teimam em me visitar todos os dias, a saudades da namorada, a saúde debilitada, etc.

Mas acho que por um momento virei o jogo. As mesmas coisas que pareciam ter afastado a inspiração, que é o motor desse blog, se juntaram para motivar a sua volta. E é nesse clima de apática melancolia que começo mais um post, depois de muito tempo.

Não sou muito adepto de postagens muito pessoais. Quem acompanha o blog deve ter percebido, mas este é um pouco atípico.

Como um perfeccionista crônico, tenho como companheira a frustração. Quando se estabelece padrões muito altos, muitas vezes na tentativa de alcançá-los, tropeçamos em algum degrau e caímos no buraco da frustração. Isso acontece constantemente comigo. E isso afeta violentamente minha relação com Deus. Bom, esse fato eu já havia constatado a tempo, mas o abandono do perfeccionismo tem sido, talvez, a escada mais alta que eu planejo subir e considero estar bem longe de alcançar seu final.

O perfeccionismo traz consigo uma faceta aparentemente boa, mas ilusória. O indivíduo perfeccionista normalmente consegue alcançar bons resultados, contando assim com a aceitação externa. Aliás, a motivação do perfeccionismo é a aceitação externa. Se eu deixar de ser perfeccionista não terei resultados tão bons e, conseqüentemente, perderei a aceitação de muitas pessoas. É um jogo que consome a saúde do indivíduo em busca de uma vida sem erros. É assim que tenho vivido, muitas vezes. Quanto custa o amor e a aceitação das pessoas que amamos? Quanto custa o amor de Deus?

Lembrei de Pedro, o discípulo de Jesus. Ele, aparentemente, não era perfeccionista. Pedro era sanguineo (conforme a teoria das personalidades de Hipócrates), daqueles que agem por impulso, que não tem freio nenhum entre o cérebro e a boca. Eu sou, declaradamente, um melancólico, mas me senti muito parecido com Pedro.

Acho que nunca foi feita tal estatística, mas creio que a cada dez palavras dos discípulos direcionadas a Jesus, oito eram de Pedro. Pedro adorava mostrar a Jesus sua segurança, determinação, capacidade de liderança, etc. O único problema é que, na verdade, eram todos adjetivos falsos em relação a esse discípulo. Pedro era só um seguidor cheio de mazelas emocionais tentando ganhar a aceitação de Jesus. O Mestre poderia pregar sobre seu amor infinito, sua graça, sua aceitação a todos, mas Pedro achava que precisava fazer sua parte. Essa história de ser aceito sem ter que fazer nada não pode ser verdadeira, pelo menos não na cabeça de Pedro. Suas ações e palavras estavam tentando sempre comprar um pouquinho da aceitação e do amor divinos.

Alguma semelhança entre você e Pedro? São inúmeras as vezes que eu tento comprar o amor de Deus: seja indo na igreja, servindo, fazendo atos de justiça própria, ou como seja. E, creio eu, a igreja está cheia de gente assim, que acredita que precisam fazer de tudo para serem aceitos por Deus. Ir à igreja, buscar a santificação, servir no corpo de Cristo é errado, então? De forma nenhuma. Mas isso é conseqüência do amor dele por nós, e não a maneira com que vamos fazer que ele nos ame. Nós, muitas vezes, nos parecemos às religiões mais primitivas, que adoram a um deus para aplacar sua ira. Às vezes penso nas minhas motivações e tenho vontade de caminhar até o altar novamente e aceitar a Jesus de novo.

Você lembra como foi o tratamento de Pedro? Negando a Jesus. O homem que, durante três anos, tentou ser aceito pelo Rei dos Judeus cometeu um erro imperdoável: negou a seu Mestre. Jogou três anos de esforço fora em apenas algumas horas.

Alguns dias depois do ocorrido Jesus se reencontra com Pedro e pergunta se Pedro o amava. Em sua pergunta, Jesus utiliza o verbo agapao, que em grego dá a ideia de um amor incondicional. Pedro, em sua resposta, utiliza o verbo philia, que denota um amor de amigos, menos intenso que agape (ou agapao). Finalmente Pedro reconhece suas limitações. Reconhece que ele não é nem mesmo capaz de amar a Jesus da forma como deveria. Finalmente ele não tenta comprar o amor de Jesus com seu esforço, porque percebe que seu esforço sempre será em vão. Surpreendentemente Jesus responde a Pedro: Apascenta minhas ovelhas. Ou seja, mostra a Pedro que, apesar de tudo, ele é aceito não só por Deus, mas ainda conta com a confiança de Deus para realizar sua obra. Quando Pedro falhou e desistiu ele, finalmente, se sentiu aceito.

Será que nós teremos que falhar como Pedro para que nossos olhos vejam que nada do que fizermos nos fará mais aceitos aos olhos de Deus? Quanto tempo vai demorar para que percebamos que já somos 100% aceitos, sem termos que fazer nada?

Quanto custa o amor de Deus? Nada. Isso é o que chamamos de graça.

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