A Base


Estou disposto a viver uma vida de fé muito mais humilde do que tenho vivido!

Repetidamente tenho tentado viver corretamente, esperando que Deus vá cumprir seu papel de me dar algo em troca. Mas não tenho visto Deus cumprir seu papel. Estou fazendo tudo que me ensinaram desde pequeno e seguem me ensinando. Tropeço muitas vezes e cometo o que entendemos por “pecado”. Peço perdão da minha lista de pecados diários e me consolo com o fato de eu estar tentando viver corretamente. Mas não tenho visto Deus cumprir seu papel de me dar o que eu acho que mereço. O que é pior: vejo pessoas que têm atitudes bem menos corretas que eu recebendo todo o tipo de bênçãos. Mas não tenho visto Deus cumprir seu papel de me dar o que eu tenho pedido.


Descobri que penso que Deus tem uma dívida comigo: eu estou fazendo as coisas da maneira mais correta possível, muito melhor que outras pessoas da igreja, então ele deve, pelo menos, me dar algumas dezenas de bênçãos. Não percebi eu que essa atitude neo-evangélica que eu tanto condeno também está dentro de mim. Essa motivação maligna e farisaísta habita a alma deste cristão há vários anos.


A Bíblia diz que nós amamos porque Ele nos amou primeiro. Acredito que havia um só uma motivação em Deus quando ele criou o homem e seu entorno: Deus precisava amar. Eu imagino Deus, no período pré-criação, transbordando amor. O efeito desse dilúvio de amor por parte de Deus foi a criação do homem. O ser humano foi, ao mesmo tempo, efeito e objeto deste dilúvio de um sentimento perfeito. Se você acha que foi criado para amar a Deus ou adorá-lo, está completamente equivocado. É muita pretensão achar que Deus necessita de algo de nós. Ele apenas quer nos dar amor - um amor comprometido a nos fazer felizes a qualquer custo. Há ainda aqueles que crêem que foram criados para servir a Deus e acabam vivendo como escravos. O homem foi criado para ser amado por Deus. Por isso que, afastados de Deus, sentimos um vazio existencial enorme que tentamos saciar com relacionamentos amorosos, sexo, bebida, festas, etc. Tudo isso é, na sua essência, uma busca religiosa - uma busca por Deus.


Amar a Deus é apenas conseqüência. Primeiro Ele nos ama e, conforme recebemos este amor, passamos a amá-Lo. Nosso amor por Ele é como uma chama, onde o Seu amor por nós é o combustível. Não há como amar a Deus sem ter convicção de que Ele nos ama. E assim, quanto mais cremos e vemos seu amor, mais o amamos.


Este versículo de João 4:19 omite o pronome “o”. Ou seja, está escrito “nós amamos”, e não “nós o amamos”. O capítulo quatro de João fala do amor ao próximo e este versículo nos dá a fórmula para lograrmos isto: receber o amor de Deus. Amar o próximo também é uma conseqüência de crermos que Deus nos ama. É um fruto e, como todo fruto, uma conseqüência. Ou seja, o fruto é a conseqüência natural da árvore, e não a árvore do fruto. Da mesma maneira só daremos fruto se crermos que Deus realmente e incondicionalmente nos ama.


Pois bem, se Jesus nos disse que o cumprimento da Lei se resume em “amar a Deus e ao próximo como a si mesmo” e se João nos mostra que estes dois são conseqüências de recebermos o amor do Pai, nos resta dizer que ser amados pelo Pai e crer neste amor incompreensível é a base da fé cristã. (Se alguém discorda dessa conclusão e acha que estou eximindo o cristão de suas responsabilidades, por favor, comente.)


Neste ano eleitoral onde estamos ouvindo diversas propostas e promessas para um país melhor eu gostaria de propor algo às igrejas: que voltem a pregar sobre o amor de Deus e que voltem a fazer com que as pessoas se sintam amadas. Essa mudança de foco parece extremamente irresponsável, mas eu acredito que todo o resto: ofertas, vidas restauradas, curas, responsabilidade, transformação, e tudo o que esperamos que esteja acontecendo no interior de uma igreja e da vida de seus membros virá a partir daí. Voltemos à base da Bíblia: “e Deus amou ao mundo”.


Quanto a mim, caí no erro de pensar que poderia dar algo a Deus. Vivi muito tempo com um fariseu bem escondido dentro de mim. Além de pensar que poderia dar algo a Deus, pensei que ele deveria dar algo a mim como recompensa. Estou percebendo que Ele deu tudo, e que minha salvação e a sua bondade não depende do que eu faço, mas do que já foi feito por mim. Como escrevi há algum tempo atrás, humildade talvez seja reconhecer que preciso ser amado por Deus. E estou disposto a viver uma vida de fé muito mais humilde do que tenho vivido!

p1

A Igreja no Brasil


“Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de todas as tuas forças.” (Marcos 12:30)


Freqüento igrejas evangélicas desde que nasci. Fui batizado uma vez quando criança na Igreja Luterana, fiz a confirmação de meu batismo aos doze anos na mesma igreja, fui batizado mais uma vez, agora por imersão, em uma igreja neo-pentecostal. Participei de encontros, pós-encontros, pré-encontros, igrejas com visão de G12, etc. Além disso, freqüentei igrejas em outro país e conheci crentes das mais diversas regiões do mundo e pertencentes aos mais diversos braços da cultura evangélica. Confesso que essa longa jornada, não apenas visitando, mas freqüentando muitas igrejas em muitos lugares, deu-me uma visão bastante ampla do círculo evangélico.

Foi uma grande luta manter-se firme passando por diversos lugares e diversas épocas, visões e modismos das igrejas evangélicas, principalmente vendo tantos amigos que estavam totalmente imersos em modismos e “paixões” desistindo da fé. Cada vez mais aumenta o número de apóstatas do século XXI, que não conseguem permanecer firmes nas igrejas que mudam tanto de visão. O problema é que a igreja evangélica recebe revelações boas e saudáveis, mas as leva a extremos, fazendo com que a revelação acabe perdendo sua validade.

Para combater os extremos surge uma revelação nova, totalmente contrária à antiga. Logo essa também se torna extremista e perde sua razão. Esse modus operandis não é privilégio da Igreja brasileira. A literatura já mostrava essa tendência humana de se contrapor a visões buscando outro extremo. Por exemplo, nos períodos literários brasileiros encontramos logo após o Romantismo, o Realismo – duas correntes totalmente contrárias, e assim com outros períodos.

A Igreja no Brasil começou demonstrando seu amor a Deus com todas suas forças. Diversos missionários europeus e norte-americanos entregaram suas vidas com o objetivo de evangelizar o país e fazer do protestantismo o que ele é hoje no Brasil. O movimento missionário influenciava muita gente e até houve alguns mártires em solo tupiniquim.

Já quando me lembro de minha infância, no que se refere a minha experiência, recordo-me de uma igreja que amava a Deus de todo o seu coração. O foco principal eram os sentimentos. As músicas, como sempre retratando a cosmovisão de uma cultura, eram bem emocionais e muito tocantes. Apesar de algumas correntes de hoje dizerem que as emoções são más, a maioria das pessoas que conheço e estão firmes hoje na igreja tiveram sua experiência de conversão nessa época, inclusive eu.

Logo começaram a surgir movimentos que ressaltavam o espiritual, amando a Deus com toda sua alma. Muitos, inclusive eu, foram seduzidos por uma onda que parecia conhecer mais a Deus. do que qualquer outra antes dela. O espiritual começou a ser o foco principal de todas os cultos e reuniões: oração em línguas, profecias, pessoas caindo, unções de todos os tipos (humanas, animais e vegetais), libertações com ou sem questionários, etc. O segredo para o sucesso era acrescentar o termo "profético" a qualquer atividade. Logo os sentimentos foram excluídos e começaram a ser taxados de maus. As igrejas diziam viver um avivamento, demonstrado por “moveres” do Espírito. Este era o avivamento final: o João Batista dos últimos tempos. O mundo “secular” foi esquecido, e com ele a atuação social da Igreja. Em minha opinião, o extremo dessa visão tornou a Igreja mais medíocre que nunca.

Agora surge uma nova era no meio da Igreja brasileira: o intelectualismo. Volta-se a dar crédito a intelectuais e reformadores do passado. Até os artistas famosos da “era espiritual” da Igreja parecem aderir à nova onda, onde mestres como C. S. Lewis, Francis Schaeffer, John Piper, Spurgeon, Chesterton e outros pensadores cristãos voltam à ativa influenciando milhares de mentes, principalmente jovens. A Igreja começa a rejeitar o secular/sagrado e se voltar a ação social. Estamos aprendendo a amar a Deus de todo o entendimento.

Eu estou muito satisfeito com este novo rumo que a Igreja no Brasil está tomando, porque se adapta mais ao meu estilo: adoro ler, escrever, etc. Porém a Verdade não está sujeita a estilos: é absoluta. Se não aprendermos a equilibrar, ou melhor dizendo, amar a Deus na plenitude de nossa força, coração, alma e entendimento logo virá uma nova revelação e muitos dos que hoje crêem vão ter suas mentes confundidas. Tomara que a Igreja aprenda a amar a Deus com todo seu entendimento, sem chegar a ser extremista, e una a isso todas as lições aprendidas nas outras épocas vividas pela Igreja brasileira, para que sejamos firmes e tenhamos firmeza no que cremos e apresentamos ao mundo.

Que a Igreja aprenda a amar a Deus!

p1