Sobre escandalos, profecias e individualidade.

Os escândalos sempre estiveram presentes na história cristã. Jesus alertou que seria inevitável que eles acontecessem, mas ai daquele que fizesse tropeçar a um dos pequeninos do Mestre. Por algum motivo, temos vivido uma série de escândalos no meio evangélico. Já são tantos que não sabemos mais qual codinome usar para expressar nossa fé. Se digo que sou evangélico, sou comparado a alguns pastores de igrejas que esqueceram que Jesus escolheu a pobreza e que não se cansam de tirar mais dinheiro do povo. Se digo que sou crente, sou comparado a pastores que acreditam que só seus membros irão pro céu, e por justiça própria; esqueceram-se daquele que nos salvou pela graça. Se digo que sou cristão, sou comparado à fé comum brasileira: milhares de católicos não-praticantes que se dizem cristãos, mas nem sabem mais quem é Jesus. (Perdão a todos aqueles membros fieis dessas igrejas).

Há pouco tempo atrás li sobre a revelação obscura e mal contada das farsas de Davi Silva. Se Deus permitiu que essa história viesse à tona foi para que seu povo aprendesse alguma coisa. Talvez tenhamos que aprender que não devemos aceitar qualquer “revelação” ou qualquer pastor que surge com alguma nova onda, doutrina, ou como queira chamar. Espero que o povo evangélico, cristão e crente aprenda que a duvida não é contrária a fé, mas aliada. A dúvida nos ajuda a buscar respostas e não julgar (para bem ou para mal) nenhuma pessoa. O que a Bíblia nos adverte a lutar contra se chama incredulidade, que é algo muito diferente da dúvida. Fico extremamente indignado com os enganadores que se valem da credulidade ignorante de milhares de pessoas para comprar para si novos carros, novas casas e vendem um evangelho sensacionalista, cheio de instrumentos de magia gospel e abracadabras evangélicos.

Mas há um vídeo que me causou um sentimento misto de ira e compaixão, talvez parecido, em proporções bem menores, àquele que motivou Jesus a destruir todo o mercantilismo que, como uma invasão do MST, tomou a casa onde Deus habitava. No vídeo, um homem chama pessoas por nome e sobrenome, revelando seu local de nascimento, nome de parentes, etc. Todas as informações dadas pelo pregador estavam no perfil do Orkut dos fieis “revelados”. Inclusive em alguns momentos o “profeta” se confunde por não ler corretamente a informação do perfil. Não bastasse, tudo isso ocorre em uma igreja em Londres, no continente menos evangelizado do planeta.

O que mais me marcou foi ver as pessoas chorando descontroladas enquanto o pregador revelava seu nome e sobrenome. Só Deus conhece as motivações, mas esses pobres fiéis que estavam sendo enganados refletiam um ar de sinceridade em seu semblante e em seu choro. Então, refletindo sobre o caso, me dei conta de algo que permeia o fato de as profecias pessoais terem se tornado tão frequentes e desesperadamente buscadas pelas igrejas de contexto pentecostal.

Não me sinto com autoridade para falar sobre o assunto profecia na igreja. Com certeza é um dom do Espírito, conforme Paulo em Coríntios, mas o papel das profecias pessoais na igreja atual deveria ser reconsiderado. O que quero comentar é o porquê desse tipo de profecia ter um lugar tão alto nas igrejas pentecostais hoje em dia, levando muitas vezes ao engano. Como um parêntese, gostaria de comentar que a Bíblia nos recomenda que “não desprezemos a profecia”, porém não nos fala para a aceitarmos sem antes ser provada, analisada à luz da palavra. Nós devemos ter um relacionamento pessoal com o Senhor, o que significa, por definição, que falamos entre nós. Ou você gostaria que alguém lhe desse um recado mandado pelo seu cônjuge após um dia inteiro estando com ele? Obviamente, a profecia cumpre diversos outros papeis na vida da igreja.

Quando pensamos em profecia acreditamos que o “sucesso” delas na igreja de hoje se deve ao fato de todos ansiarem por saber seu futuro. Com certeza este é um dos pontos, mas acredito que não seja o mais relevante. Vendo esse vídeo me dei conta de que todo o ser humano que busca a Deus necessita saber que é conhecido por Ele. Todos nós queremos saber que Deus conhece o nosso nome, o nosso sobrenome, nossos parentes, nossos problemas pessoais, a placa de nosso carro, a hora que saímos de casa, nosso hobby, nosso sabor de pizza favorito. A profecia nos dá a sensação de sermos únicos, importantes. Que Deus conhece nossa intimidade.

Logo que vi o vídeo, mostrei-o a meu amigo Isaac, que prontamente me respondeu com uma citação de Martim Lutero: “Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos, nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para o que há de vir.” Ela vale muito bem para esta situação. A Bíblia nos fala, repetidamente, que o Senhor conhece nosso nome (Êxodo 33:17), conhece a hora que saímos e chegamos a casa, a hora que acordamos e dormimos (Salmo 139). Deus se importa com quem vamos nos casar, com nossos amigos, com as coisas que nos preocupam. Ele conhece nossos gostos: fica alegre quando nós comemos nossa comida favorita. Ele se preocupa, ou melhor, entra em ação quando nos machucamos ou quando estamos nervosos para uma prova. Ele nos oferece um colo quando tudo vai mal e a única coisa que podemos fazer é dormir. Tudo isso está na Bíblia, ninguém precisa lhe dizer, porque o Senhor deixou escrito a milhares de anos atrás, porque ele sabia que eu e você precisavamos saber isso.

Deus não nos fez todos iguais porque ama a individualidade (não confunda com individualismo). E se ele ama a individualidade, ele ama os detalhes que nos fazem únicos. Feche seus olhos por um momento, acalme seu coração e escute em seu espírito o quanto Ele se importa com seus detalhes!




"Eu tenho um Criador. Ele formou meu coração mesmo antes de tudo começar. Minha vida estava em Suas Mãos. Eu tenho um Pai. Ele me chama de seu. Ele nunca vai me deixar, não importa onde eu vá. Ele sabe meu nome. Ele sabe todo meu pensamento. Ele vê cada lágrima que cai. E me ouve quando eu chamo".

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